(Resenha) #15 As Horas

As Horas

Michel Cunningham
Drama

Editora Companhia das Letras 

Olá, hoje vamos conhecer um livro ganhador do Premio Pulitzer, decidi ler As Horas, porque já havia assistido ao filme, faz muito tempo e não me lembro mais de muitas coisas do filme, mas uma coisa me lembro muito bem, que é o fato de ter gostado demais.

"... Richard saiu atrás dela, pôs-lhe a mão no ombro e disse: "Olá, viva, Mrs. Dalloway". O nome de Mrs. Dalloway tinha sido ideia dele uma opinião manifestada numa noite tipo dormitório de bêbados, quando lhe garantiu que Vaughan não era o apelido adequado para ela. Devia, disse-lhe, ter o nome de uma grande figura da literatura, e, enquanto ela se pronunciara a favor de Isabel Archer ou Ana Karenina, Richard insistira que Mrs. Dalloway era a única e óbvia escolha. Havia o pormenor do seu primeiro nome verdadeiro, sinal demasiado evidente para ser ignorado, e, mais importante ainda, a questão do destino..."

Na história acompanhamos um dia na vida de três mulheres separadas uma da outra por quilômetros de distância, e por décadas de idade, mas unidas por um livro Mrs Dalloway

• Em 1023, Virginia Wolf está começando a escrever Mrs Dalloway, ela está prestes a receber a irmã e os sobrinhos, ela pensa em como lidar com os empregados como sua irmã, mas o que mais a domina é sua vontade de voltar para sua querida Londres, mas para isso suas dores de cabeça e as vozes precisam sumir...
• Em 1949, Laura Brown é uma dona de casa normal de Los Angeles, ela tem um marido maravilhoso que a ama, um filho lindo de 3 anos que a idolatra, e está gravida, ela tem tudo para ser considerada feliz, seu marido Dan está fazendo aniversário e ela quer fazer um bolo e retribuir todo esse amos, mas algo dentro de Laura não vai bem...
• Em 199X Clarissa Vaughn está preparando uma festa para um amigo que ganhou um premio literário, ao mesmo tempo seu passado bate na porta, e ela reflete sobre as coisas que deixou para trás, as coisas que poderiam ter sido, as escolhas que fez e sobre envelhecer e ver os jovens repetindo o passado.

" ... Ela sonhou com um jardim e sonhou com uma frase para o seu novo livro - que frase? Flores, alguma coisa relacionada com flores. Ou alguma coisa relacionada com um jardim? Estava alguém a cantar? Não, a frase apagou-se, e na realidade não tem importância, pois Virginia ainda conserva a sensação que ela deixou atrás de si. Sabe que se pode levantar e escrever."

O livro é muito bonito, sensível, delicado e melancólico. O autor escreve o cotidiano de três mulheres tão diferentes entre si, e tão reais, e mesmo algumas das discussões propostas por ele no livro, não fazerem parte da realidade de algumas pessoas, ela cai como uma luva para outras. Cada capitulo intercala uma das três protagonistas, são três histórias bem diferentes, mas que possuem pontos em comum, 1- as três vão dar uma pequena festa, 2- as três tem medo de falhar e 3- as três tem um momento banal durante o dia que deflagra uma crise. 

Eu me senti muito tocada pelo livro, queria falar tanta coisa, mas as palavras simplesmente não me vem, o livro tem tantas mensagens em suas páginas, como o relacionamento mãe/filho, amor livre, momento deixados para trás, abandono do lar, o medo de falhar, suicídio (aliás foi o melhor livro que trata do assunto que eu já li). E muitos desses temas já passaram por minha cabeça, eu sou tão ansiosa e tenho tanto medo de errar que sofro muito por antecedência.

"Ela devia estar lá, não devia? Devia estar ao fogão, com o seu roupão novo, pródiga de conversa simples e encorajadora. No entanto, quando abriu os olhos há minutos (já depois das 7 - quando ainda habitava parcialmente o seu sonho, uma espécie de mecanismo trepidante, numa distância remota, um bater regular como o de um gigantesco coração mecânico, que parecia estar a aproximar-se), apercebeu-se da sensação abafada e úmida à sua volta, da impressão de não estar em lado algum, e soube que ia ser um dia difícil. Soube que ia ter dificuldade em acreditar em si mesma, nas divisões da sua casa, e quando olhou para este livro novo na mesa-de-cabeceira, posto em cima do que acabara de ler a noite anterior, estendeu maquinalmente a mão para ele, como se ler fosse a única e óbvia primeira tarefa do dia, a única maneira viável de efetuar a transição do sono para o dever."

Não li o livro Mrs Dalloway, mas pelo que andei fuçando várias situações que acontece no livro As Horas fazem referencia ao livro de Virginia Wolf, algumas até eu percebi, isso sem falar nos trechos do livro que aparece nos capítulos de Laura, porque ela está lendo o Mrs Dalloway e também temos alguns detalhes do planejamento de Virginia para o livro.

O único porem que vi na edição que li (em e-book) foi justamente  os trechos do livro nos capítulos de Laura, as vezes parecia estranho, daí no final do paragrafo ficamos sabendo que era o livro, não sei me confundiu um pouco e, algumas vezes precisei voltar para entender,

"Tira o frasco da prateleira e ergue-o para a luz. Contém pelo menos trinta comprimidos, talvez mais. Volta a pô-lo na prateleira.

Seria tão simples como alugar um quarto de hotel. Tão simples como isso. Imagina como poderia ser maravilhoso deixar de ter importância. Imagina como poderia ser maravilhoso não se preocupar mais, ou esforçar-se, ou falhar."

Indico para todos que estejam com vontade de ler um drama sensível e bonito, que tem muito para falar, mas sem ser invasivo.